Hoje transcrevemos as palavras do nosso cardeal-patriarca de Lisboa, D. José Policarpo (fonte: Agência Ecclesia), na sua homilia de Páscoa:
“A Ressurreição de Jesus e a surpresa da vida”
1. A Páscoa é a festa da vida. Esta é a maravilha da criação, encerra toda a beleza, é o desafio de todas as descobertas, a semente do horizonte que se abre sempre de novo em busca da sua plenitude. É na nossa experiência de seres vivos que podemos descobrir Deus, o Vivo e fonte da vida. O respeito pela vida é o pilar decisivo de toda a civilização.
A ressurreição de Jesus foi surpresa, mesmo para os seus amigos mais próximos, porque a plenitude da vida exprimiu-se na vitória sobre a morte, que em termos humanos, aparece como o fim da vida, a negação da vida. Afinal, a vida venceu a morte.
A ressurreição de Jesus é a plenitude do mistério da encarnação. Quem ressuscitou foi o Homem, Jesus de Nazaré. Aquela vida nova, desconhecida e misteriosa, é uma vida humana, do Filho de Deus feito Homem, para garantir a todos os homens, seus irmãos, que o triunfo da vida é possível. Tendo-se unido a todos os homens, a sua ressurreição encerra a promessa do maior anseio da humanidade: viver sempre, aprofundar a experiência da vida. Quem se uniu a Cristo nunca desiste de viver, nada o trava no anseio da vida em plenitude.
2. A ressurreição de Cristo encerra o segredo da vida, comunica-nos uma pedagogia da vida. Ela revela-nos que é preciso fazer da vida um dom, para a descobrir e alcançar. A generosidade do dom é a essência do amor e o segredo da vida. Aprofundar a vida é indesligável do amor. Do seu triunfo sobre o sofrimento e a morte, recebemos força para fazer da nossa existência um dom. Todas as causas generosas para o bem da humanidade recebem dessa fonte a coragem da generosidade. A ressurreição de Cristo continua a ser uma força decisiva para o triunfo do homem.
A beleza da vida está impressa na criação como dinamismo fundamental.
Basta contemplar o êxtase da mãe que dá à luz um filho, ou a exultação de um amor sincero que dá sentido a toda a existência e a inunda de felicidade. Esta está sempre ligada à fruição da vida. A vida sente-se quando se descobre a vida do outro. A alegria da vida é sempre a alegria do amor. A ressurreição de Cristo dá perenidade a estas experiências belas da natureza, que sem a ligação à vida, corremos o risco de deixar esmorecer ou mesmo atraiçoar. É como se a vida se desmoronasse sob os escombros da infidelidade humana. Percebe-se porque é que Jesus pregou aos discípulos com tanta insistência: “Dou-vos um mandamento novo, que vos ameis uns aos outros como Eu vos amei” (Jo. 13, 34).
A nossa fragilidade continua e a sua concretização mais grave é atraiçoar a vida, desistir da vida. É o pregão do Apóstolo Paulo aos Coríntios: “Celebremos a festa, não com fermento velho, nem com fermento de malícia e perversidade, mas com os pães ázimos da pureza e da verdade” (1Co. 5,8). Unidos à ressurreição de Cristo, a nossa vida transforma-se progressivamente na força que nos aguenta, na alegria de viver, fazendo viver, descobrindo sempre novas manifestações desse dom supremo de Deus.
Vivemos num tempo em que se fez da qualidade de vida um valor a conseguir.
Mas não haverá qualidade de vida se reduzirmos esta ao bem estar material. Ela só se consegue com um coração aberto à surpresa da ressurreição. Nela é-nos revelada a fonte da vida, o amor de Deus pelo Seu Filho Jesus Cristo, amor que envolve todos os homens nossos irmãos.
Nesta Páscoa façamos como o Apóstolo João: aos primeiros sinais da morte vencida, acreditou. Esta nova manifestação da vida surpreendeu-os; deixemo-nos surpreender pela Vida.
Sé Patriarcal, 31 de março de 2013
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