Neste dia que antece o dia especial que é o Natal, transcrevemos aqui a mensagem de Natal do Bispo do Porto, António Francisco dos Santos:
Um Natal sem embargo
1. Mais
do que de palavras, o Natal é feito de vida, de gestos e de pessoas. O
Natal é feito de Deus. Celebrar Natal é celebrar o nascimento do Filho
de Deus.
Nestas semanas de Advento tenho visitado paróquias e instituições. Em
todos os lugares encontrei sempre pessoas e famílias, casas e
comunidades com vida e alma de Natal.
Inspira-se esta mensagem de Natal, o primeiro que vivo no Porto, num
relato simples, recebido por entre confidências de memórias do tempo e
desafios da missão que Deus me confia. Vem esta história de vida de uma
família de nome conhecido no País e prestigiado na nossa Cidade. O pai,
médico de profissão, costumava sair de casa cedo, na véspera de Natal,
como se tivesse diante de si um longo dia de trabalho.
No ano em que o seu terceiro de seis filhos concluiu o Curso de
Medicina convidou-o a acompanhá-lo nessa aparente rotina de Natal.
Levou-o a Valadares a visitar uma senhora pobre e só, doente cancerosa,
sem família que a pudesse ajudar. Depois passou por um Orfanato do
Porto, assim se dizia ao tempo, visitou as crianças e colocou
discretamente nas mãos da Irmã Superiora um envelope com uma oferta. Aí
se demorou durante a manhã.
O filho médico, agora dedicado a uma grande Instituição de Bem da
nossa cidade, ao evocar com emoção este gesto, disse-me que, nesse dia, o
pai lhe ensinou a viver sempre com espírito de Natal a sua vida como
vocação e como missão de serviço ao bem.
O Natal é para os cristãos e para os homens e mulheres de boa vontade
um tempo para que Deus nasça no coração humano e uma escola onde o bem,
a bondade, a solidariedade e a alegria do evangelho se vivem, se
encontram, se aprendem e se ensinam.
2. No mesmo dia e à mesma hora em que ouvia esta bela lição de Natal,
que vai habitar a minha vida toda e para sempre, soube que, com a ajuda
discreta, silenciosa e eficaz do Papa Francisco, a celebrar, nesse dia,
o seu aniversário, tinha terminado o embargo da poderosa Nação
americana à pequena Ilha de Cuba, depois de 53 anos de sofrimento
desnecessário e de protestos inúteis.
O fim do embargo não foi apenas a melhor prenda de aniversário para o
Papa Francisco. Foi, também, uma grande bênção de Natal para o Mundo.
Há 2.000 anos, apesar de todas as
profecias e advertências divinas, Jesus não teve lugar para nascer nas
hospedarias convencionais. Nasceu na periferia da cidade de Belém, no
seio de uma família estrangeira, que vinha de longe!
É propósito pastoral da nossa Diocese fazer da “alegria do evangelho a nossa missão”.
Queremos construir no coração de cada um de nós, no espaço abençoado
das nossas famílias e no âmbito celebrativo da fé das nossas paróquias “uma casa para a alegria do evangelho”.
Queremos ser casas e igrejas de portas abertas onde todos possam
entrar e celebrar Natal. Queremos sentar os pobres à nossa mesa de
Natal, mas precisamos, também nós, de nos sentarmos à mesa dos pobres e
com eles partilharmos a vida, afirmarmos a nossa presença solidária e
testemunhamos a beleza da fé para que não haja espaços vazios que
ninguém ocupe, caminhos que ninguém percorra, pessoas que ninguém
conheça, visite ou ame.
3. Partilharei a refeição de Consoada dos “Sós”, preparada numa das
paróquias da periferia da nossa Cidade, e viverei o domingo a seguir ao
Natal, que é o dia litúrgico da Família de Nazaré, com os sem abrigo
numa das paróquias do centro do Porto.
Penso com particular afeto e permanente oração nas famílias feridas
pela morte prematura de algum dos seus membros, magoadas pela doença,
atingidas pela rutura do amor ou a viver a provação da falta de trabalho
que o desemprego sem fim à vista provoca. Sei que para estas famílias o
Natal é mais difícil mas mais necessário!
São muitas também as lágrimas de tantas mães que choram a morte dos
seus filhos e de muitas famílias que se vêm separadas pela emigração
forçada pela crise social que atinge o nosso País ou imposta pelas
guerras e desavenças políticas em tantos povos do Mundo.
O Natal é, também, tempo para
saudar as pessoas e agradecer as instituições que neste tempo afirmam
com a verdade de sempre e com maior visibilidade o bem que realizam como
apóstolos da bondade de Deus e como servidores da alegria do evangelho,
para que o Natal aconteça e esteja ao alcance de todos.
Procuremos fazer do Natal de 2014
tempo de alegria, de esperança, de paz, de misericórdia, de bondade e de
reconciliação, ancorando-nos na certeza de que Deus fez morada entre
nós, tem berço no coração dos cristãos e está vivo e presente no meio do
seu Povo.
Em comunhão fraterna com os Bispos
que servem esta Igreja do Porto ou aqui vivem, desejo aos sacerdotes,
diáconos, consagrados (as) e leigos (as) diocesanos e diocesanas desta
amada Diocese do Porto, a quantos aqui habitam ou nos visitam nesta
época do ano, um santo e abençoado Natal!
Porto, 21 de dezembro de 2014
António, Bispo do Porto